Passo de Gigante
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quarta-feira, 27 de março de 2013
O DELEGADO E O ÍNDIO
Sábado, dia 23 de março de 2013. Em sua casa, descansando, o delegado responsável pelo plantão do centro da cidade do Rio de Janeiro recebe uma ligação às 3 horas da madrugada. No correio de voz do celular o inspetor enviava um recado: “Senhor, acabou de chegar um flagrante. Agressão, dano ao patrimônio público e desacato. Um índio bêbado quebrou a lanterna do carro do BOPE e quando estava pra ser preso esmagou uma pimenta no rosto de um sargento. Está uma confusão aqui!”
O delegado desperta, se arruma rápido e corre para a delegacia. Na delegacia esperava um homem com short, sem camisa, de chinelos. Os olhos já demonstravam uma desesperança misturada com álcool, e a sujeira misturada com sangue denunciavam o “cuidado” que os PMs tiveram ao conduzir o índio.
Sabendo da desapropriação da Aldeia Maracanã ocorrida no dia anterior, e solidário a reparações que o Estado brasileiro deve às populações indígenas, o delegado, gentilmente, entra na sala comendo uma maçã e oferece uma outra ao índio.
- Aceita?! Essa é boa, orgânica! Adoro frutas!
- Obrigado. Eu também – responde o índio sorrindo. – O senhor conhece cambucá?
- Não.
- E o senhor já comeu mucagê?
- Também não – sorri o delegado.
- E embauba?
- Não.
- E ubucaba?
- Não – responde já sério o delegado.
- E umbu?
O delegado já fica em silêncio, apenas acena negativamente com a cabeça.
- E a fruta do lobo, já comeu?
- Chega! Vamos direto ao ponto. Bebeu, brigou e quebrou! De repente posso te ajudar, mas estou aqui e quero fazer justiça!
Depois de alguns segundos em silêncio, sério, o awá responde:
- O senhor gosta de fazer justiça da mesma forma que gosta de fruta?
Pergunta o delegado sem responder:
- De onde você é? Como chegou aqui?
- Sou do litoral do Pará, aí a gente desceu o rio porque perdemos a terra. Descemos o rio e fugimos para o sul de Goiás. Aí chegaram os fazendeiros, os bois, e a gente foi para o norte de novo, no encontro dos rios Tocantins e Araguaia (sul do Pará). Aí chegou a Vale do Rio Doce, e não tinha mais pra onde ir.
- Isso tem quanto tempo?
- Uns 500 anos.
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terça-feira, 5 de março de 2013
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