Manuscrito II do Min. Geraldo Bezerra de Menezes (sem data)
Cargos de direção
Conquanto, a rigor, não se
possa falar em co-gestão no plano do direito individual do trabalho, ou seja,
da livre contratualidade, são frequentes os casos de antigos empregados
admitidos em postos modestos e que atingem, com o correr dos anos, posição de
relevo e mando na empresa: gerentes, diretores de sucursais, de departamentos,
diretores gerais e outros. O que não impede a nomeação de novos empregados
diretamente para essas funções de alto nível. Num e noutro caso, participa o
titular do chamado cargo de direção, técnica ou administrativa, de largo poder
de coordenação, de disciplina e controle.
O tema, de ressonância
sociológica e não apenas econômica e jurídica, vem suscitando questões novas na
disciplina trabalhista, entre elas a da função diretiva como profissão e o
consequente aparecimento de nova categoria profissional diferenciada, a de
dirigentes de empresa, bem assim a distinção e relacionamento entre empresários
proprietários e gerentes profissionais, estes de “colaboração imediata” e
“responsabilidade direta”, segundo Pergolesi. Lembro sobre o assunto a lúcida
monografia de João Antero de Carvalho – Cargos de Direção no Direito do
Trabalho, 3ª ed., Rio, 1974. Prima, na bibliografia estrangeira, a
contribuição de Ferrucio Pergolesi – Contratto di Dirigenza Aziendale
(Enc. Del Dir. 12ª vol.), de grande expressão doutrinária.
A visão do problema sob
duplo ângulo também ocorre com a participação nos lucros, em que se distingue a
coletiva da individual, esta resultante do contrato de trabalho.
Exemplo pouco
significativo de participação
Tipo de participação do
pessoal, através de comissões internas, nós o temos no setor de
acidentes do trabalho. Segundo o disposto no art. 82 do Decreto-lei nº 7.036,
de 10 de novembro de 1944: “Os empregadores, cujo número de empregados seja
superior a 100, deverão providenciar a organização, em seu estabelecimento, de comissões
internas, com representantes de empregados, para o fim de estimular o
interesse pelas questões de prevenção de acidentes, apresentar sugestões quanto
á orientação e fiscalização das medidas de proteção ao trabalho, realizar
palestras instrutivas, propor a instituição de concursos e prêmios e tomar
outras providências tendentes a educar o empregado na prática de prevenir
acidentes”.
Naturalmente, a disposição
pouco significa no plano da representação do pessoal. Entretanto, em alguns
países as comissões de segurança e higiene constituíram, historicamente, o
ponto de partida mais extensa colaboração efetiva dos empregados.
Antigos pronunciamentos
coletivos em prol da co-gestão
Duas antigas manifestações
ocorrem-me de pronto. Tristão de Ataíde, em artigo recentíssimo, publicado no
“Jornal do Brasil”, de 14 de março último, a respeito da Co-gestão, declara que
o princípio “já constava do programa da Liga Eleitoral Católica de 1933”. Por
outro lado, o Segundo Congresso Brasileiro de Direito Social, realizado em
1946, na capital de São Paulo, promovido pelo Instituto de Direito Social, à
frente o famoso Professor Cezarino Júnior, aprovou recomendação, reconhecendo
que “a participação dos empregados na gestão da empresa é um ideal a ser
atingido por etapas, subordinando-se a sua efetividade à preparação dos
trabalhadores e à sua gradativa integração na administração da empresa”. E
indicou “os conselhos de empresa como meio eficiente para chegar gradativamente
a este ideal”.
Tentativas, de ordem
legal, de criação das comissões de empresa.
No projeto de lei
regulamentar da sindicalização, apresentado ao Congresso em 1948 pelo
Deputado João Mangabeira, cogitou-se “dos delegados e das comissões de
empregados (Projeto nº 1.267 – D, de 1948)”.
No ante-projeto do Código
de Trabalho do preeminente Professor Evaristo de Morais Filho, no título da
Organização da Empresa, há um capítulo dedicado aos respectivos conselhos.
Velhos motivos de
desconfiança contra os chamados comitês de empresa
Entre nós, pesava a
suspeita de que tais órgãos – postos com o advento dos governos comunistas de
Kerenski e Lenine a serviço da anarquia revolucionária – perturbassem as boas
relações entre empregados e empregadores. Posteriormente, na própria Rússia, os
sindicatos se insurgiram contra os comitês, julgando-os capazes de lhes
usurpar prerrogativas e enfraquecer a luta de classes.
Em numerosos sistemas
legislativos, a criação da comissão interna não teve outro objetivo senão a
harmonia das relações entre trabalhadores e empresas. São tidos como
instrumento válido e construtivo da paz social.
Crítica ao texto
constitucional brasileiro
No livro O Direito do
Trabalho e a Seguridade Social na Constituição, aduzi comentários ao texto
constitucional brasileiro. E posso resumir o meu pensamento.
A Constituição de 1967, no
art. 158, nº 5, especificou, no rol dos direitos que tendem à melhoria de sua
condição, “a integração do trabalhador na vida e no desenvolvimento da
empresa, com a participação nos lucros e, excepcionalmente, na gestão,
nos casos e condições que forem estabelecidos”.
A Emenda Constitucional
nº1, de 1969, alterada a redação, manteve a norma. Leia-se o item V do art.
165: “Integração na vida e no desenvolvimento da empresa, com
participação nos lucros e, excepcionalmente, na gestão segundo for
estabelecido em lei”.
O preceito foge à boa
técnica de elaboração legislativa.
Desnecessário o
complemento – “segundo for estabelecido em lei”, substancialmente o mesmo, na
redação primitiva e na atual. Sem ele, permaneceria o inciso, em ambos os
pontos, lucro e gestão, à mercê da lei vitalizadora, pois o dispositivo não
seria self acting. Tanto um quanto outro, por sua natureza e
complexidade, não podem prescindir de regulamentação, ao menos para definir
critérios. Acrescente-se no tocante à gestão: se o direito tem caráter
excepcional, incumbe à lei especificá-lo.
Os autores da Lei Magna
excederam-se em preocupações, ao emprestar categoria constitucional à outorga.
Não foram sóbrios. Foram tímidos e, além do mais, imprecisos. Com a restrição
imposta à gestão, possibilitaram o entendimento de que a participação nos
lucros não sofreria limitações.
No teor em que a questão
foi colocada, o silêncio seria mais aconselhável, a exemplo do que ocorrera com
a Carta de 1946. O preceito, tal como redigido, não traduz uma conquista. Ao
contrário. Pode conduzir o legislador a limites inconcebíveis. Omisso o texto
não impediria, pois não o coibiu na vigência do Estatuto Supremo de 1946, a
regulamentação da matéria, através de lei, em algumas áreas da atividade
econômica: sociedades de economia mista e outras. Afinal, o art. 165, deixa
claro que os direitos assegurados aos trabalhadores nos seus vinte incisos, não
excluem “outros que, nos termos da lei, visem à melhoria de sua condição
social”.
Urge a lei vitalisadora do
preceito constitucional
A afirmação da epígrafe
não significa, de modo algum, que defendamos uma legislação a vapor,
inconsequente, para preencher o vácuo constitucional. Seríamos ingênuos.
Contudo, é irônico dizer que somos apanhados de surpresa para regular a
matéria.
Temos o direito de
insistir, realisticamente, num truísmo: se a norma existe – e está enunciada na
Lei Magna, há treze anos – é para ter vigência. A Constituição da República
Federativa do Brasil concedeu à co-gestão um título de legitimidade. O
legislador ordinário não pode usurpá-lo com o seu silêncio. Ou deixá-lo on
paper, no terreno vulgar do anúncio, da promessa, e, na melhor das
hipóteses, de sugestão de mudança.
A pura verdade é que os
vazios constitucionais são comprometedores, acarretam natural desconfiança à
formação e à sensibilidade jurídica de um povo. Num Estado de direito, -
outra verdade trivial – não se
marginalizam preceitos constitucionais.
Aos que assumem posição
contrária à co-gestão, e persistem em divulgá-la, advirto que o instituto não
está em jogo. E sim a sua regulamentação. Não obstante, avanço um juízo. Para
os objetivos em vista, tenho improcedente a alegação, mal humorada, de falta de
preparo ou maturidade profissional do trabalhador brasileiro. Ele tem dado mil
e uma provas de capacidade de organização e direção, que, obviamente, não é
exclusiva desta ou daquela classe. Impossível ignorar que os trabalhadores
compreendem categorias que vão do empregado manual ao mais altamente
qualificados – gerentes, engenheiros, advogados, contadores, cientistas,
pesquisadores, etc., todos sujeitos à remuneração em suas múltiplas formas. Não
só. Leve-se em conta que os empregados, ao lado dos empregadores, há muito
participam dos órgãos decisórios, tanto da Organização Internacional do
Trabalho, como da Justiça do Trabalho e da Previdência Social.
Outro ponto, este de
contribuição à lege ferenda. É de esperar, tendo em conta a realidade
jurídico-social dos grupos econômicos, regulados, entre nós, primordialmente,
pela Lei das Sociedades Anônimas, que tal participação, não se restrinja às
empresas controladas, mas se estenda à controladora, caput ou
tronco-mestre do grupo, e que foi alcançada pela legislação de outros países,
Suíça e Alemanha por exemplo, e na regulamentação da Comunidade Econômica Europeia.
Em França, a inclusão foi ditada por força de jurisprudência.
Injustificável lacuna da
Lei das Sociedades Anônimas
A despeito de atualíssima
a Lei das Sociedades Anônimas deixou in albis a co-gestão. Precário
argumento da colocação ou enquadramento do instituto, traduzido na fugidia
alegação de non est hic locus.
Nada acrescentou o diploma
brasileiro ao simples relacionamento dessas sociedades e grupos com os
empregados no plano dos direitos e obrigações. Estranha omissão, se atentarmos
em que já dispúnhamos do art. 2º da Consolidação das Leis do Trabalho e da lei
do trabalhador rural (lei nº 5.889, de 1973), reportando-se à matéria, sem
grande precisão.
A Lei das S.A. dispõe
sobre “a associação e os grupos de sociedades”. E os ilustres autores do
projeto, na justificação, enfatizaram este ponto crucial: “No seu processo de
expansão, a grande empresa levou à criação de constelações de sociedades
coligadas, controladas, grupadas – o que reclama normas especiais que
re-definam, no interior desses agrupamentos, os direitos das minorias, as
responsabilidades dos administradores e a garantia dos credores”. Tudo isso, e
um silêncio completo sobre os trabalhadores.
Claro está que a lacuna é
injustificável, tanto mais quanto foi frisada a mudança, no plano social, por
que passa o capitalismo.
A visão democrática do
problema deve ser devidamente equacionada, a ponto de alcançar a relação
capital-trabalho.
Quanto se afirma e
reafirma que, nas grandes empresas, “homens se agrupam e se associam para a
consecução de seus objetivos”, não há razão plausível para que, dessa
perspectiva empresarial, dessa conjugação de esforços, se omitam ou excluam os
empregados. Permanecemos presos, à temática da exploração industrial ou ao
terreno estritamente econômico, considerado completo o quadro com a só
substituição, já operada entre nós, do “monopólio regalista” pela “soberania
societária”, através da assembleia geral dos acionistas, aspecto este sempre
destacado pelos autores do projeto e outros juristas no exame da Lei das S.A.
A Constituição e a
legislação ordinária de outros países
Impossível, neste ensaio,
passar em revista o grosso da legislação de outros países no plano
constitucional e comum, voltada à co-gestão. Restrinjo-me a exemplos mais
sugestivos, com as características básicas do respectivo ordenamento, partindo
da República Federal Alemã, reconhecidamente a pioneira da mithestimung.
Antes, vale acentuar que a Conferência Internacional do Trabalho, em sua XXXV
reunião, de 1952, aprovou a recomendação nº 94 sobre a consulta e a colaboração
dos empregados no âmbito da empresa.
Alemanha
No exame do Direito do
Trabalho nas Constituições modernas, destacamos que a de Weimer, de 1919,
cuidava dos conselhos operários de empresa, e outros, no art. 165.
A lei alemã de
constituição de empresa, promulgada em 14 de outubro de 1952, estatuiu a
representação do pessoal. Outra lei, a da co-gestão na indústria do aço, ferro
e minas, de 21 de maio de 1951, ensejou, quando de sua elaboração, uma greve de
grandes proporções. Previu o diploma a representação do pessoal nos órgãos
estruturais da empresa, instituindo o sistema da co-gestão nos mais de mil
trabalhadores.
O que importa é assinalar
os dois diplomas alemães, o primeiro de 1972, a Lei Constitucional do
Estabelecimento, pela qual são regulados os conselhos de estabelecimento; o
segundo, a lei de co-gestão, de 1976, que regula o conselho de superintendência
das empresas, sua composição, suas funções. Esses últimos “supervisionam e
controlam o controle da sociedade” e são apontados como principal instrumento
de organização da sociedade anônima alemã. Deles participam os empregados na
mesma proporção dos detentores do capital. Confere-se ainda que a representação
é proporcional ao número de empregados, partindo de dois mil. Nos grupos de
empresa ou econômicos, prevalece o princípio, inclusive para a empresa
controladora, e neste caso os empregados de todas as empresas do grupo
participam da escolha do representante.
Na conferência pronunciada
em São Paulo, em setembro de 1978, o jurista alemão Richard Osswald ao
reportar-se à lei da co-gestão de 1976, realçou o seguinte: “Caso os
representantes do capital e dos trabalhadores nas votações se bloqueiem
reciprocamente, o presidente do conselho de administração, que normalmente
pertence à representação do capital, tem o voto de desempate e pode, com isto,
garantir a maioria de sua representação” (Ver. Leg. do Trab, março de 1979,
pags. 42/43). Nos dois planos, do estabelecimento e da empresa, insiste o autor
na exigência de um clima de cooperação e confiança, de consenso social e
interesse produtivo.
Itália
Preceitua o art. 46 do
Pacto italiano, em vigor a partir de 1º de janeiro de 1948: “Visando à elevação
econômica e social do trabalho, em harmonia com as necessidades de produção, a
República reconhece o direito dos trabalhadores a colaborar, segundo as
modalidades e nos limites fixados por lei, na gestão das empresas”. O texto tem
sido objeto de estudos aprofundados de juristas italianos, F. Pergolesi, E.
Colleti, Marcos Vais e Mario Nigro, entre outros.
Prevalece, no país, o
sistema da duplicidade de órgãos: comissões internas (comissioni interne) e
conselho de gestão (consiglio di gestione), sendo os últimos paritários. As
comissões objetivam à tutela no campo profissional e da assistência, e
resultaram de acordo confederal de 18 de abril de 1966, que as disciplina. Elas
atuam dentro da empresa, contrariamente aos sindicatos, “che stanne al di
fuori”, como sublinham os mestres italianos.
Em termos de participação,
a Constituição peninsular vai mais longe. Prevê, no art. 99, a ...... dos
representantes dos sindicatos no Conselho nacional da economia e do trabalho, a
que são atribuídas funções consultivas e iniciativa em matéria econômica e
social. Consulte-se o estudo de Giuseppe Chiarelli sobre o Conselho, in Enc.
del Dir., Milão, 1961, págs. 259 e seguintes.
Entre as fontes do Direito
do Trabalho italiano, os seus juristas colocam “a fonte comunitária, isto é, os
regulamentos emanados da Comunidade Econômica Europeia (C.E.E.), instituída com
o Tratado de Roma de 1957, e a Carta Social Europeia, de 18 de outubro de 1961,
ratificada pela Lei nº 925, de 3 de junho de 1965” (Ignazio Scotto, Man. di
Dir. del Lav., Roma, 1974, pág. 21).
França
Em França, o Código
Fundamental de 1946, reformado por lei constitucional de 1954, declarava no
preâmbulo: “Todo trabalhador participa, por intermédio de seu delegado, na
determinação coletiva das condições de trabalho, assim como na gestão da
empresa”. Essas e outras disposições foram mantidas na Constituição de 1958.
Repercutiram as palavras
de Ramadier, proferidas na Assembleia Nacional Constituinte de 1946: no momento
em que se proclamam os direitos da pessoa humana, desejamos que, entre as
mesmas, se inclua o de afirmar seu direito de associar-se aos que se encontrem
investidos na direção técnica ou na direção geral das empresas, a fim de que o
trabalho adquira mais alta consciência das dificuldades de seu papel, tanto
quanto do valor social que representa e, por isso mesmo, das obrigações que
deve assumir no conjunto do corpo social.
Advirta-se, porém, que no
plano dos princípios a co-gestão não é um direito natural; esse magistério da doutrina
social católica.
Em verdade, Ramadier
empunhava a bandeira de Millerand, erguida em 1922, na Câmara dos Deputados, ao
proclamar “um contra-senso que, em países republicanos e de sufrágio universal,
se pudesse pensar em manter na empresa a monarquia absoluta”.
Igualmente explícita a
manifestação de Louis Maire: “A empresa – diz ele – foi primeiramente
idealizada segundo a imagem da família patriarcal; evoluiu depois para a
monarquia constitucional” (Au dela du Salariat – L’Organisation Social du Travail,
2ª ed., Lauzanne, 1945).
Segundo esses
pronunciamentos, eis a tônica ou a pedra fundamental da co-gestão: introduzir
na ordem social ou a ela estender os princípios que regem a democracia
política.
O sistema francês funciona
através dos delegados do pessoal, das comissões internas e da participação nos
órgãos de administração. Segundo Maurice Cohen, “a lei não atribui senão função
consultiva às comissões de empresa na área profissional, econômica e
financeira” (Le Droit des Comités d’Entreprise, Paris, 1977).
Espanha, Portugal e outras
nações
Espanha.
A Lei nº 41, de 21 de julho de 1962, regulamentada pelo Decreto nº 2.241, de 15
de julho de 1965, estabelece a participação do pessoal na administração das
empresas que adotem a forma de sociedade. Na exposição de motivos, acentua-se
“a necessidade de incrementar, cada vez mais, a compenetração entre os
distintos fatores humanos da produção”. Consulte-se José Manuel Almansa Pastor,
La Participación del Trabajador en la Administración de la Empresa, Madrid, 1965.
Em Portugal, a
Constituição, nos artigos 55 e 56, institui as comissões de empresa,
discriminando direitos.
Paulo C. Moura aponta-nos,
sumariamente, o exemplo de outros países, como o Japão, Venezuela, Bolívia e
Paquistão (em Co-gestão, afinal o que é? – “Jornal do Brasil”, de 24-2-1980),
com os seguintes esclarecimentos:
Existem, no Japão, os
comitês de consulta, com poder real nos assuntos relativos à higiene e
segurança. A Venezuela mantém o instituto nas empresas nacionalizadas e
a Bolívia nas minerações estatais. Requer o Paquistão um
empregado na diretoria de cada empresa com mais de 50 empregados.
Países onde os conselhos
de empresa resultam de acordos coletivos
Na Inglaterra, Canadá,
Estados Unidos e países escandinavos, Dinamarca, Noruega e Suécia, os conselhos
de empresa resultam de acordos coletivos e têm, geralmente, constituição
paritária. Na primeira são exemplos os comitês Whitley, difundidos após a
Primeira Guerra, e os Joint production committee, durante e após a Segunda
(Veja-se Jeremia Newman, Co-Responsability in Industry – Social Justice in
Labor Management Relations, Dublin, 1955). Órgãos dessa natureza, os comitês de
produção, com o apoio do Governo, foram instituídos, desde 1943, no Canadá
(Industrial Democracy at Work, Otawa, 1945).
As comissões mistas ou
paritárias instituídas nesses países têm por escopo incrementar a
produtividade, num clima de compreensão do fator humano na empresa, além da
consequente elevação do trabalhador e sua integração na vida e nos destinos
desta unidade econômica e social.
Na Suécia, estou em
lembrar a histórica convenção de colaboração, firmada a 30 de agosto de 1946
entre a Confederação patronal (S.A.F., Swenska Arbetsgivare Föreningen) e a dos
trabalhadores (L.O., Landsorpanisationen), em que se reconheceu o comitê de
empresa como um órgão de informação e consulta, incumbindo-lhe “informar o
pessoal das condições econômicas e técnicas da empresa e dos resultados por ela
obtidos” e, por outro lado, “de maneira geral, assegurar à empresa boas condições
de trabalho e de produção”. Veja-se
Charles Leger, La Démocratie Industrielle et les Comités d’Entreprise em
Suéde, Paris, 1950, e Ake Bouvin, La Nouvelle Legislation Suédoise sur
la Democratie, in « Rev. Int. Tr. », março-abril, 1977.
Mercado Comum Europeu
O Mercado Comum Europeu
trouxe inovações no campo da co-gestão. Instituída em Roma, no ano de 1957, a
Comunidade Econômica Europeia imprimiu diretrizes novas às sociedades dos
Estados-membros para que se ajustassem às exigências do Tratado ou à integração
econômica.
Sabe-se do esforço com a
preparação de projetos atinentes à criação de um estatuto próprio para tais
sociedades. Lembra um estudioso nosso, Octávio Bueno Magano, na excelente obra Os
Grupos de Empresa no Direito do Trabalho (São Paulo, 1978), que o texto
básico de 26 de junho de 1974 contém três partes importantes, do ponto de vista
do Direito do Trabalho: “a conceituação e disciplinação do grupo: a de
organização das comissões de empresa e a da participação dos trabalhadores nos
conselhos de superintendência”. A representação dos trabalhadores está sujeita
à eleição entre os mesmos, para um mandato de três anos, assegurando-lhes a
estabilidade provisória durante o mandato, isto é, sic et quantum. São
múltiplas as atribuições conferidas às comissões na defesa dos trabalhadores no
âmbito do direito do trabalho, da segurança, saúde, higiene e assistência
social.
Há estudos sem conta
dedicados à matéria no contexto dos países do mercado comum. Na riquíssima bibliografia, figuram: Willian Garcin, Cogestion
et Participation dans lês Entreprises des Pays du Maché Commun (Paris,
1968) ; Ives Djian, Le Contrôle de la Direction des Societés Anonymes
dans les Pays du Marché Commun (Paris, 1965) e obras coletivas : Droit
Institutionnel des Communautés Européennes (Paris, 1974) e La
Representanza di Lavoratori sul Plano dell’Impresa nel Diritto di Paesi Membri
della CECCA, Milão, 1959, o último sob plano mais restrito.
Renovação da empresa
Vê-se, com realismo, em
termos meridianamente claros, que a empresa está sujeita a um processo de
redefinição, melhor, de renovação social e jurídica. A mudança do seu conteúdo,
num crescendo de adaptação e criatividade, emerge não só de pressões externas,
sociais especialmente, mas de sua própria expansão e dos imperativos da
economia moderna.
Michel Despax é claríssimo
ao advertir que “a empresa deve ser analisada não em termos individualistas e
contratatuais, mas institucionais e comunitários” (Le Droit du Travail,
Paris, 1970, pág. 93).
Nesse quadro, as suas
responsabilidades no campo social, aqui e alhures, envolvem novas metas, que se
sobrepõem à seqüência dos conhecidos “programas de caridade” ou “cometimentos
semifilantrópicos”, que não correspondem às exigências modernas. Com essas
revelações, não se pretende aniquilar o dinamismo e a energia da livre
iniciativa ou transformar a unidade de produção num mero instrumento do Estado.
Longe disso.
Outro aspecto,
distinguem-se nas grandes empresas de nossos dias a propriedade e o controle. É
o que prevalece nas sociedades anônimas e nos grupos econômicos, em que os
pequenos acionistas não participam do controle ou das decisões. Em regra, esse
poder é transferido a terceiros, administradores ou técnicos, que assumem a
direção da empresa. O Professor William Letwin, da Escola Econômica de Londres,
no estudo sobre O passado e o futuro do empresário americano, chegou a
ponto de aludir, com evidente maldade, “aos gordos, lustrosos e empoados
executivos”.
Relativamente aos
técnicos, situando-os na empresa contemporânea, são conhecidos os estudos
especializados de James Burnham e John Galbraith.
Ao mesmo tempo, no que
concerne aos grupos, convém realçar o poder abusivo da sociedade dominante, tal
a sua capacidade de absorver e de crear e recrear firmas ou sociedades
satélites. Em face da justaposição interna-externa, é o mesmo que dizer da
dicotomia investimentos estrangeiros-objetivos nacionais, a questão ganha
relevo quando se trata de multinacional. Todos esses fatos têm conduzido a uma
legislação, quanto possível, rigorosa e com processos mais equânimes, mais
flexíveis, mais democráticos de administração.
Ponto pacífico na doutrina
e na legislação – importantíssimo na visão moderna da empresa – é o de que,
para o Direito do Trabalho, em harmonia com os critérios de objetivação da
responsabilidade, não importa a pessoa particular do empresário, senão a
entidade empresa, a que o empregado se vincula, subsistindo tais laços quando
se produz a troca na sua titularidade (Ver, entre muitos, Miguel Hernainz
Marquez, Trat. de Der. Del Trab., 12ª ed., Madrid, 1977). Orlando Gomes
é incisivo: “No direito pátrio, o que conta é a entidade objetiva da
organização” (Questões de Direito do Trabalho, 1974, pág. 195).
Além do mais, predomina
entre os doutrinadores, a refletir realidade substancial, o reconhecimento de
que a empresa moderna, embora atenta aos problemas específicos da produção,
custos e lucros, procura fortalecer os vínculos da relação de trabalho com a
pessoa humana do trabalhador, processando-se essa relação, mediante liames comunitários
de pessoas e interesses. E tudo a concorrer para que, aos choques e às
divergências, prevaleçam a harmonia e a paz no seio da empresa. Acordo com
essas perspectivas, veja-se a análise objetiva de João XXIII na Mater et
Magistra.
Finalmente, registre-se o
consenso, expresso na Constituição e na legislação ordinária de diferentes
países, a fim de que se acolha, sem sobressaltos, a nova concepção de empresa –
unitária, integrativa, institucionalista, partilhada do bem comum e capaz de
favorecer a ação conjunta.
Aí está, não esmiuçado,
mas simplesmente delineado, o processo de democratização da empresa, que os
europeus preferem designar de democracia industrial.
Solução brasileira para a
co-gestão
Enfrentamos um desafio
nesta fase de transição social. Felizmente, a questão em pauta ou sub judice
é considerada, no caso brasileiro, longe de infiltrações ideológicas, de
radicalismo, de impulsos insensatos ou de intolerância. Antes assim. Se o
Direito do Trabalho, na lição esclarecedora de Camerlynk e Lyon-Caen, em obra
conjunta, Droit du Travail (Paris, 1975, pág. 27), sujeita-se à
conjuntura e à infra-estrutura econômicas, mais acentuada é a dependência
tratando-se da co-gestão.
Embora atentos, como devemos
estar, à experiência de outros povos, não podemos importar modelos. Seria um
erro, de sérias consequências, transplantar para um país de tantos contrastes
na ordem econômico-social e de desenvolvimento in fieri, regimes de
co-gestão ensaiados em países de economia complexa e grande produtividade,
dotados de outras condições culturais.
Quer pela diversidade da
política social e econômica a que, necessariamente, se ajusta, o que deve ser
repetidamente acentuado, quer ainda por sua complexidade, não há um projeto
único no terreno da co-gestão. Haverá semelhantes. Idênticos, não.
O importante é encontrar,
na regulamentação da norma constitucional, uma solução brasileira, gradual,
imune a desvios, adequada à nossa realidade, ao espírito e grau de desenvolvimento
de nossa gente.
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