Certa vez, um estudante que passou tanto no
vestibular da UFF quanto no da UFRJ, apareceu no ICHF. Ele queria saber qual
das faculdades de ciências sociais era melhor. Nessa ocasião responderam que
professores bons e ruins existem em todas, mas para saber, /Há de estudar com
amor,/ E ver no Gragoatá o Sol de pôr.
O Sol ilumina,/ Um conto contado sem assombro, /De
todos os personagens dessa história,/ Seremos imagens guardadas na memória,/ Quando
estivermos acompanhados/ De uma só sombra.// Separados,/ Vemos a unidade,/ Diferenças,
conflitos e sonhos.
Bom, falarei da Universidade, que na verdade é uma
localidade, quase uma entidade. Para o que mal a conhece, perdoa-me pelos
detalhes que não poderei falar. Não tente imaginá-la, deixe a imagem flutuar,
passe de leve; a menor idéia lhe bastará.
Gostaria de apresentar algumas questões. A primeira
se refere ao fato de que estudar na Universidade Pública significou conviver
com greves, isto é, conviver com a luta contra a privatização, que ocorre de
forma gradativa. A resistência histórica dos professores, técnico-administrativos
e estudantes, desde a greve de 1996 que derrubou o Projeto de Emenda
Constitucional n. 370 (PEC-370), que já visava instituir a possibilidade de
cobrança de mensalidades naquele momento; denunciamos as propostas de autonomia
financeira que desresponsabilizava o governo federal de custear a educação. A
greve coloca hoje, sob o pano de fundo dos atos de corrupção do governo Lula,
velhos objetivos de deixar o ensino superior nas mãos invisíveis do mercado.
Repetimos: educação não é mercadoria!
Falar que o mercado dará o tom da música em que
dançaremos a sinfonia das ciências sociais, quer dizer que tocaremos uma marcha
fúnebre. Pois as ciências sociais desarmadas da crítica ao status quo,
Capital/capitalismo, representará a morte do pensamento criativo e
transformador.
Hoje, mais da metade dos estudantes do ensino
superior pagam mensalidades, não pagamos. Temos o direito de exigir uma nova
direção, uma nova reitoria, o direito e a possibilidade de pesquisar. Mas isso
não quer dizer que vocês estão olhando para privilegiados, para uma futura
elite nacional, para futuros politiqueiros. Estudar ciências sociais significa,
acima de tudo, renúncias e opções.
Renunciamos o amor cego ao dinheiro, pela capacidade
de ver através das letras, de ver através das falas, de ver através.
Renunciamos às certezas de uma vida sem questionamentos, aos questionamentos de
uma vida de certezas. Isto é, escolhemos ser mal compreendidos, e, assim, descobrir
novos significados para as palavras: etnocentrismo, preconceito, igualdade e
liberdade.
Falar em universidade é falar em profissões, com
significados diferentes, em escolhas. Quais valores a UFF deveria passar para
formar um cientista social?
Nietzsche diz que uma profissão nos torna
irrefletidos; nisso estaria sua maior bênção. Pois ela é um baluarte, atrás da
qual podemos licitamente nos retirar, quando nos assaltam dúvidas e
preocupações comuns.
Depois de quase cinco anos aqui dentro queria mandar
um recado pra Nietzsche: você está errado. O cientista social formado pela UFF
utiliza suas dúvidas e preocupações comuns como objetos de análise de um mundo
onde não nos retiraremos. Como espelhos que aumentam e diminuem as imagens,
refletimos o que há de pior e melhor; e num mundo onde reina o conflito e a
desigualdade, sejamos a mudança.
Boa Noite!
Rodolfo Lobato, 05 de setembro de 2005.