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terça-feira, 29 de janeiro de 2013

O GOVERNO E A CAMARA MUNICIPAL DA CORTE

Bezerra de Menezes, Adolpho. O GOVERNO E A CAMARA MUNICIPAL DA CORTE. Artigos publicados da “Reforma” pelo Dr. Bezerra de Menezes. Rio de Janeiro, Typographia da “Reforma” na rua do Ouvidor n. 143, 1873. Parte I do livreto, autoria:Adolpho Bezerra de Menezes, presidente interino da Camara municipal da Corte do Rio de Janeiro, 20/V/1873.


I

É como disse no senado o Sr. Barão de Cotegipe:

“O nosso governo não cessa de dizer: que é urgente alargar o circulo das attribuições municipaes; mas também, não perde occasião de engrossar, à custa das municipalidades, o immenso cabedal de poderes que já tem.”

Só de uma vez, e para melhor caracterisar a sua sinceridade, o gabinete de 7 de março atacou por três lados a municipalidade da corte; e isso ao tempo em que o Sr. Rio Branco dizia, com accento da mais entranhada convicção, estas bem significativas palavras:

“Nos relatórios dos actuaes ministros, bem como nos dos seus dignos collegas que pertencerem ao gabinete de março, o nobre deputado há de encontrar que o ministério adhere inteiramente ao seu pensamento de que cumpre dar mais vida, mais acção e independência às municipalidades....”

Quem ouviu S. Ex. e quem leu esse trecho de seu discurso de resposta ao Sr. Conselheiro Paulino, não podia deixar de exclamar: chegou, emfim, a vez de ser realisada uma das mais reclamadas reformas, a das camaras municipaes; e de ser realisada no sentido da descentralisação administrativa, pelo augmento de vida, de acção e de independência que o gabinete quer conceder às municipalidades.

Pois iludiu-se grosseiramente quem pensou assim, quem deu às palavras do nobre presidente do conselho o sentido que ellas naturalmente tem!

Enquanto se pronunciavam aquellas bellas theorias estabeleciam-se praticas de todo em todo oppostas!

Emquanto se dizia à nação, do seio de sua representação: que o gabinete adhere inteiramente ao pensamento de dar mais vida, mais acção e independência às municipalidades, o gabinete limitava ainda mais a acção da camara da corte, retirando-lhe o direito de conceder licença para o estabelecimento de trilhos nas ruas de sua cidade; attentava contra sua independência, chamando a si a construcção do matadouro, obra que ella propuzera fazer administrativamente, pello que nem dependência tinha de approvação do ministro do império; e por fim atacava a própria vida moral da camara, mandando tomar conta da praça da Acclamação, e fazer obras, que dizem ser para seu ajardinamento, sem ao menos dar parte de sua resolução à municipalidade, cuja vida, acção e independência quer alargar!
Razão teve o Sr. Conselheiro Paulino, e n’esse ponto exprimiu o sentimento geral, quando às palavras do Sr. Presidente do conselho respondeu com muito expressiva phrase latina: res, non verba.

Com effeito, uma vez que as promessas do Sr. Rio Branco teem valor opposto à sua significação, livre-nos Deus de suas palavras.

Venham, antes, as suas obras, porque diante d’ellas, ao menos, ninguém mais se illudirá com esperanças vans.

E por esta questão das municipalidades, aprenda o paiz a aquilatar o valor das promettidas reformas no sentido de firmar o equilíbrio dos poderes públicos, dando independência ao ramo legislativo; no sentido de garantir o voto livre, tirando ao governo o arbítrio que tem de eleger os representantes da nação; no sentido de estabelecer sobre bases seguras, de ordem e de liberdade, o governo da nação pela nação.

Aprenda o paiz a conhecer, por questão das municipalidades, que o gabinete de março, mesmo quando falla à nação, respondendo aos seus representantes, usa da palavra como de um meio para encobrir o que pensa e o que pretende fazer sobre as differentes questões que se discutem.

Quer alargar a esphera da acção das camaras municipaes; e faz passar uma lei annullando a disposição que garante às camaras o direito de construir seus matadouros onde melhor lhes parecer, segundo o interesse comum!

Quer alargar a esphera da acção das camaras; e sob fúteis e sophisticos fundamentos procura roubar-lhes o direito secular e universal, tanto quanto garantido em sua lei orgânica, de prover, como julgar do interesse das povoações à viação publica, nas suas respectivas circumscripções territoriaes!

Quer alargar a esphera da acção das camaras e dar-lhes mais vida e mais independência; e sem dar-lhes a menor satisfação, arranca-lhes praças por ellas aterradas e nivelladas, para mandar ajardinal-as por sua conta!

Conciliem, si poderem, os homens sensatos o dizer com o fazer do gabinete!

E sejam muito felizes os que poderem comprehender a administração de um paiz regido por taes princípios e a cargo de homens que assim procedem!

Parace que até o pudor já desappareceu d’entre os nossos homens de estado!

N’outros tempos, um ministro de estado, ou tinha a coragem de ajustar suas palavras a seus pensamentos e às suas resoluções; ou, si era fraco, recuava diante das resoluções que não se atrevia a sustentar.

Não há exemplo de um ministro de estado vir alegre e galhardamente illudir a nação, dizendo da tribuna parlamentar o contrario do que está praticando!

Acaso estaremos mais adiantados do que esse homens, nossos avós, que presavam sua dignidade mais que as posições, e que preferiam deixar taes posições a illudir a nação, manchando-se com a insiceridade?!

Ou teremos dacahido ao ponto de já ser considerado espírito superior o que despresa até as leis da decência, o que descura do bom ou máo conceito de seus concidadãos?

Seja como for, o gabinete que não perdeu a confiança da coroa pelo facto provado de ter, por meio da imprensa subvencionada, levantado uma opinião publica simulada, à fim de illudir a coroa, não póde agora receiar da nação, pelo facto da havel-a illudido, proclamando o contrario do que estava praticando.

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